sexta-feira, 13 de abril de 2007

MARTINELLI, Marcello. Cartografia Ambiental: uma cartografia diferente? São Paulo: Revista do Departamento de Geografia v. 7, p. 61-80, 1994.

A problemática ambiental envolve questões físicas, sociais, culturais e políticas do ambiente e tem sido de interesse de um conjunto de entidades e ciências.A representação gráfica tem um grande potencial para contribuir com esta discussão, através dos mapas possui uma tríplice função: Registrar informações, processar dados e denunciar as distorções comunicando posteriormente os resultados obtidos.Daí se concebe a cartografia ambiental considerada como um setor específico da cartografia temática – um dos ramos da ciência cartográfica.O desenvolvimento da cartografia temática se dá a partir do século XVII e XVIII quando a cartografia topográfica, com seu inventário exaustivo, passa a fazer representações mais complexas, os mapas especiais, clássica denominação dos mapas temáticos.O código utilizado pela cartografia topográfica era analógico, com o desenvolvimento da cartografia temática o código foi se transformando em abstrato. A cartografia começa a ganhar reconhecimento como forma de comunicação. Ao tornar-se uma linguagem autônoma no século XIX, desenha-se, já neste período, uma primeira preocupação de cunho semiológico.No campo ambiental busca-se uma cartografia que possa abarcar os diferentes aspectos do ambiente, buscando uma cartografia integrada.Como desenvolvimento das tecnologias de Sistemas de Informações Geográficas e Sensoriamento Remoto, esta contribuição para a questão ambiental se tornou mais intensa.Contudo, muitas vezes, a cartografia torna-se uma representação contemplativa, mascarando os problemas ambientais ao representar da mesma forma elementos que possui situação ambiental diferenciada (um exemplo é o rio, que aparece geralmente com a coloração azul, independente do seu estágio de degradação ambiental). O que é necessário, no entanto, é que a cartografia possa revelar o seu conteúdo, de forma abrangente e esclarecedora socializando o mapa e sua finalidade.“[...] a cartografia não poderá ter, [...],uma função meramente ilustrativa. Na pesquisa. Ela deve constituir um meio lógico capaz de revelar, sem ambigüidades, o conteúdo embutido na informação mobilizada e, portanto, dirigir o discurso do trabalho científico de forma abrangente, esclarecedora e crítica, socializando e desmistificando o mapa, enaltecendo assim, a finalidade social da ciência cartográfica.” P.63Martinelli, apresenta os diferentes métodos de analise da natureza – dialético e sistêmico. Aborda também as características das metodologias de analise da paisagem e geossistemas. A busca destes métodos é entender a questão ambiental na contexto da interação sociedade e natureza. Na Geografia destaca-se o trabalho de Tricart, Sotchava, Monteiro, Troll. No caso da cartografia hoje há duas principais correntes:Uma com base no paradigma sistêmico e outra no semiológico.A primeira está atrelada à teoria matemática da comunicação, e a segunda de cunho estruturalista associa a cartografia à linguagem, trata-se da representação gráfica – constituindo um sistema de signos para comunicação social, porém de caráter monossêmico (significado único). “Sua especificidade reside no fato de estar fundamentalmente vinculada ao âmago da relação entre os significados dos signos, como acontece na matemática. Não se atrela à relação entre o significado e o significante dos signos, característica fundamental da linguagem polissêmica (significados múltiplos), como acontece na comunicação feita através da fotografia, da pintura, da publicidade,etc..., que criam imagens figurativas”. P.64A tarefa essencial da representação é apresentar três relações entre os objetos e relações visuais de mesma natureza, sem ambigüidades. São elas: a diversidade, a ordem e a proporção.“A representação gráfica coloca, tanto o emissor como o receptor, como atores diante de três relações fundamentais entre conceitos previamente definidos, as quais deverão ser transcritas por relações visuais de mesma natureza, como já adiantamos. Este é o sistema de comunicação monossêmica”. P.64A proposta sistêmica, também passa por uma revisão crítica. Salichtchev (1978) segundo Martinelli, aponta que: “o processo de comunicação cartográfica não fica apenas atrelado aos ditames da já citada Teoria Matemática da Comunicação, a qual considera somente as perdas de informação em cada etapa do processo, preocupando-se essencialmente na minimização destes extravios. Ao mobilizarmos o processo de comunicação cartográfica pode-se obter um acréscimo de informações o qual se cristaliza principalmente na etapa conclusiva[...]. Com efeito, na etapa da utilização do mapa estimula-se uma operação mental bastante específica: há uma interação entre o mapa como produto concreto e os processos mentais do usuário. Esta operação não se limita somente à percepção imediata dos estímulos, envolve também a memória, a reflexão, a motivação e a atenção”.p.64Não há ainda uma conceituação definida do que se considera a cartografia ambiental, um desafio a ser superado na cartografia. Assim como há conceituação diferenciadas para o tema ambiente, para a cartografia ambiental predomina-se desde representações analíticas exaustivas a propostas de uma cartografia na perspectiva de um sistema semiológico polissêmico, a cartografia como arte. Uma questão que a cartografia ambiental deve considera é a escala temporo-espacial para cada tema a ser representado. Segundo Martinelli, “A necessidade, [...] de se conceber uma cartografia que leve em conta, de um lado, a articulação dos diferentes níveis de análise em conformidade com as ordens de grandeza em que os fenômenos se manifestam, e de outro, as combinações e contradições que acontecem entre os conjuntos espaciais definidos pelos fenômenos sob apreciação, num mesmo nível temporo-espacial.” P.65“A escala adequada para um mapa ambiental, atendendo a determinado propósito, tem a ver com a categoria de estudo, a parte da realidade de interesse, evidentemente compatível com a resolução do fenômeno ou fenômenos nela enquadrados, os quais, por sua vez demandam certa duração para a sua organização e conseqüente manifestação espacial característica.” P.65“Entre a variedade de escalas possíveis de serem adotadas não há somente diferenças qualitativas, há também diferenças quantitativas, pois um fenômeno tem sua organização e representação apenas em dada escala. Em outras escalas passa a não ter mais representação, alterando seu significado. A realidade aparece diferente conforme a escala dos mapas, segundo os níveis de análise que ela foi considerada. Esta questão poderia implicar no escamoteamento da realidade: uma omissão perante a sociedade.”p.66O autor apresenta a necessidade de se ter uma cartografia que de um lado articule os níveis de analise conforme ordens de grandeza dos fenômenos manifestados e de outras contradições e combinações que surgem entre os conjuntos contando com nível tempo-espacial, entrando assim em outro detalhe: a escala, adequada para cada mapa ou categoria de estudo, parte da realidade interessada e a resolução dos fenômenos. Deve-se considerar que alguns fenômenos só têm representação em dadas escalas e em outras passa a não ter. Dentro das propostas metodológicas, segundo autor, os estudos só se tornam ambientais quando se passa a incluir o homem no meio com suas interações e atividades, ou seja, passa a ser um elemento. Diante dos diversos tipos de mapas dentro da área ambiental, segundo MARTINELLI (a proposta de JOURNAUX 1975; 1985), propõe três níveis:- 1º nível: mapas de análise – cartografia dos elementos e dos processos simples; - 2º nível: mapas de síntese – cartografia de associações de elementos ou de processos para definir sistemas, ou para realizar mapas de aptidão ou dos riscos; - 3º nível: mapas de sensibilização – destinados não só a conscientização do estudo do meio ambiente como também para subsidiar ações de planejamento territorial. Segundo o autor a proposta de TRICART (1977), apresenta a cartografia de estudo da paisagem a partir do comportamento, considerando três categorias dos meios:- meios estáveis;- meios intermediários;- meios fortemente instáveis.A proposta de KONDRACKI e OSTROWSKI (1980) é a cartografia baseada o Mapa do Grau de Sinantropização do ambiente, ou seja, o desaparecimento e o aparecimento de espécies relacionadas às atividades humanas.De acordo com MONTEIRO (1982;1987), considera uma cartografia num Mapa de Qualidade Ambiental, de acordo com a seguinte organização:
- organização por ordem dos graus de derivação dos ecossistemas dos simples aos complexos;- distinção dos padrões ligados ao natural e ao de ação antrópica.- tipos de poluição;- Os impactos.Outro trabalho citado por Martinelli é o de Troppmair (1983) que considera a superposição dos ecossistemas aos geossistemas.De acordo com o autor na busca pela metodologia, a cartografia de síntese é a que mais se apresenta como método.“Na representação de síntese não podemos mais contar com a participação dos elementos considerados no nível analítico, e sim a fusão deles em conjuntos espaciais característicos. Isto significa que os mapas ambientais deverão ressaltar agrupamentos de lugares definidos por agrupamentos de atributos ou variáveis.” P.68Um dos problemas desta forma de representação é a dificuldade do usuário de entender o que está sendo apresentado, por ser exaustivo.Diante disso, o autor propõe que seja realizada a coleção de mapas que além da questão o que há, própria da cartografia exaustiva, possa ser inserida a questão: tal atributo onde está? Esta proposta é de Bertin (1973, 1977) que busca dar ao usuário a possibilidade da analise de conjunto. Outra questão metodológica é a analise dinâmica. Já que grande maioria dos mapas apresenta uma visão estática.O dinamismo dos fenômenos deve ser apreciado no tempo e no espaço. Martinelli apresenta diferentes propostas para esta questão: OZENDA, 1986; JOURNAUX, 1968; 1975; BERTIN (1977); FALINSKI, (1985); DOCHE (1983); LAPOLLI et alli (1990). Martinelli apresenta outras representações gráficas que podem complementar mapas (perfis, blocodiagramas, fotografias). As representações gráficas são usualmente utilizadas por geógrafos como meras ilustrações enquanto “deveriam se colocar na condição de revelar o conteúdo da informação, o qual orientaria o discurso científico, permitindo ao leitor uma reflexão crítica sobre o assunto”p.78. Segundo Martinelli embora a cartografia ambiental ainda não tenha alcançado uma sistematização completa, é necessário estabelecer esforços para que se construa uma metodologia adequada ao tratamento das questões ambientais.

Marquiana de F. Vilas Boas Gomes
Professora Msc. Depto. de Geografia
Centro de Ciências Agrárias e Ambientais - CEDETEG
Universidade Estadual do Centro Oeste (UNICENTRO)- Guarapuava-PR

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